Um novo Princípio: O Princípio da Boa Boa Administração

 Um novo Princípio: O Princípio da Boa Boa Administração

Carolina Sofia Gomes Vaz1

Resumo: O presente trabalho pretende explorar o amplo princípio da boa Administração. Primeiramente, pretendemos demonstrar onde é que este princípio se encontra positivado e perceber a sua relação com os restantes princípios. De seguida, iremos analisar um caso onde de facto, não fora respeitado este mesmo princípio. E por fim, analisar se será possível ou não o controlo judicial perante a Boa Administração.

Abstract: The present study aims to explore the broad principle of good administration. Initially, it seeks to identify the legal foundations of this principle and to examine its interrelation with other fundamental principles. Subsequently, a case will be analyzed in which the principle of good administration was not upheld. Finally, the study will assess the possibility of judicial oversight in relation to compliance with this principle.

Palavras-chave: Princípio da Boa Administração; eficiência; celeridade; economicidade; justiciabilidade; interesse público.

Keyword: Principle of Good Administration; Efficiency; Expeditiousness; Economy; Justiciability; Public Interest.

Índice/Sumário: 1) Introdução; 2) O princípio da boa Administração e a sua relação com os restantes princípios; 3) A boa administração na Prática; 4) Consequências: a possibilidade de controlo judicial; 5) Conclusão; 6) Referências Bibliográficas.

Estudante do 2oano da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Turma B, Subturma 10, Sr. Professor Doutor Regente Vasco Pereira da Silva e Sra. Professora Assistente Beatriz Garcia. Trabalho final do II Semestre.

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1) Introdução

Os alicerces sociológicos da nossa sociedade são constantemente questionados. As necessidades dos cidadãos intensificam-se, enquanto a capacidade de resposta que o Estado apresenta é cada vez mais diminuta. Com as constantes crises, o bem-estar social torna-se um privilégio para uns e uma meta distante para outros. Neste contexto, a Administração e o Direito Administrativo permanecem um pilar essencial para a construção de um Estado mais eficiente, transparente e acessível. Numa sociedade globalizada e exigente, torna-se imperativo promover uma Administração Pública que seja racional, célere e orientada para resultados concretos, garantindo assim uma otimização dos recursos e a efetividade na resposta às necessidades coletivas.

Para tal, a Administração necessita de princípios orientadores que irão definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo.

Neste trabalho, debruçar-me-ei sobre o princípio da boa Administração.

Creio que haja uma questão fulcral que deve, primeiramente, ser abordada. O que é afinal, o dever da boa Administração? Segundo o Senhor Professor FREITAS DO AMARAL, entende-se por boa Administração o dever que a Administração detém para prosseguir o bem comum da forma mais eficiente possível. 2

Este princípio surge no Direito Administrativo Italiano em meados do século passado com a designação de “bom andamento da Administração” (“buon andamento della pubblica amministrazione”). Nesta época vários estados do norte da Europa vieram a desenvolver, nos seus ordenamentos, este conceito3.

No nosso país este princípio, encontra-se consagrado no artigo 267 no1 da Constituição da República Portuguesaem que se estabelece que “a Administração pública será estruturada de modo a evitar a burocratização, a aproximar os serviços das populações e a assegurar a participação dos interessados na sua gestão efetiva [...]” assim como nos números 2 e 5 do mesmo artigo quando se referem à eficácia da ação da Administração e

DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Vol. II, 2.a edição, Almedina, Coimbra, 2018, p 46.
FAUSTO DE QUADROS, Comentários à Revisão do Código do Procedimento Administrativo, 2.aedição, Coimbra, Almedina, 2022, p 23.

Doravante, CRP.

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à racionalização de meios5; na alínea c) do artigo 81 da CRP que se refere ao setor público empresarial e que com o artigo 5o do Código do Procedimento Administrativo6, este estende-se a toda a atividade Administrativa Pública.

Para além da consagração legal e constitucional, será importante pois referir que este princípio tem consagração na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, mais concretamente no artigo 41, que concede a todo e qualquer cidadão o direito à boa Administração. Assim, a Carta de Nice, moveu a boa Administração para a condição de Direito Fundamental. – Porém a comissão de revisão do CPA não se comprometeu com esta tese, deixando tal à jurisprudência administrativa a tarefa de dizer qual o valor jurídico deste princípio e se há ou não em Portugal um Direito Fundamental dos cidadãos à boa Administração, com todas as implicâncias que podem advir.

Conforme sustenta o Sr. Professor Doutor PAULO OTERO, o princípio em apreço é dotado de pluridimensionalidade, visto que a sua área de influência não se restringe ao domínio substantivo ou material das decisões administrativas, daí ser denominado por um “superconceito”.7

2) O princípio da Boa Administração e a sua relação com os restantes princípios.

É nos fundamental entender a que se refere o legislador quando, na redação do no1 do artigo 5o do CPA, faz uso dos conceitos indeterminados de eficiência, economicidade e celeridade. Veremos então pontualmente estes conceitos:

• A doutrina por eficiência tem entendido ser uma “relação entre objetivos e resultados, visando uma utilização racional ou ótima dos meios tendentes a uma maximização dos resultados” 8. Neste contexto, a boa Administração é entendida como um dever da Administração de prosseguir, da melhor forma possível, o interesse público mediante a observância de critérios extrajurídicos associados à eficiência. Relaciona-se com os meios utilizados para alcançar esse objetivo, tendo por base a distinção entre legalidade e mérito9. E foi nesta perspetiva que o

CATARINA SARMENTO E CASTRO, em Comentários ao Código do Procedimento Administrativo, Volume I, 2020, AAFDL Editora, Lisboa, 5 EDIÇÃO, Pp. 80-83.
Doravante, CPA.
PAULO OTERO, Direito do Procedimento Administrativo, Vol. I, 2016, Almedina, Coimbra, 1aedição, p. 106.

Idem, p. 107.
JOÃO CAUPERS e VERA EIRÓ, Introdução ao Direito Administrativo, 12aed, Lisboa, Âncora Editora, 2016, p. 51.

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conceito eficiência foi consagrado no artigo 5 do CPA, dando continuidade ao que já constava do artigo 10o da anterior versão do referido diploma. A eficiência manifesta-se, assim, numa série de requisitos: respeito pelos interesses legalmente protegidos, a adequação e eficácia na concretização dos objetivos que o ordenamento jurídico impõe à atuação administrativa; redução da burocracia e a observância do princípio da proporcionalidade - artigo 7o do CPA - o qual exige que os meios utilizados sejam adequados, necessários e proporcionais aos fins que pretendem alcançar10.

Num sentido mais restrito, entende-se por eficácia a otimização dos recursos da

Administração, tendo em vista os objetivos a serem alcançados.

  • O requisito de economicidade vem apegado com uma ideia de minimização das despesas públicas, restringindo-se ao estritamente necessário à satisfação das necessidades coletivas. Implica, pois, uma gestão rigorosa e eficiente dos recursos financeiros públicos, orientada para a obtenção dos melhores resultados possíveis com o menor custo, sem prejuízo da realização das atividades que competem à

    Administração. (Artigo 99 e 60/2 CPA)

  • celeridade traduz-se na obrigação da Administração Pública de operar num

    prazo razoável, assegurando a tempestividade e a eficácia da sua intervenção. Este princípio incorpora a exigência de rapidez e agilidade na condução dos procedimentos administrativos, garantindo, assim, uma resposta célere às pretensões dos cidadãos. O dever de celeridade encontra-se autonomamente previsto no artigo 59.o do CPA, o qual impõe à Administração o dever de decidir e atuar com diligência, evitando demoras indevidas.

    A verdade é que tais critérios nem sempre serão aplicados de forma uniforme e proporcional. Caberá à Administração, ao adotar uma medida administrativa, analisar, à luz do caso concreto, se, após a devida ponderação global destes critérios, a medida observa efetivamente o princípio da boa Administração.

    Relativamente à sua ligação com outros princípios. De facto, o princípio da boa Administração é, além de um direito fundamental em si, um meio de efetivação ou

    10 FAUSTO DE QUADROS, Comentários à Revisão do Código do Procedimento Administrativo, 2aed, Coimbra, Almedina, 2022, pp. 26-27.

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concretização de outros direitos fundamentais do sistema havendo portanto, um elevado grau de conexão entre este princípio com os restantes.

Cumpre salientar que, ao contrário do que ocorre com diversos princípios gerais da atividade administrativa – como o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 7.o do CPA, e o princípio da igualdade, previsto no artigo 6.o do mesmo diploma – o princípio da boa Administração não se limita a uma dimensão meramente negativa. Isto é, não se restringe a constituir um mero critério de controlo da atuação administrativa orientado exclusivamente para a proteção de posições jurídicas individuais, desconsiderando, assim, os aspetos relacionados com a eficiência e a racionalidade da atividade administrativa11.

A boa Administração é então um princípio orientador de toda a atividade administrativa,

todavia, este necessita, igualmente, do apoio de outros princípios, tais como o princípio

da Proporcionalidade, que serve de “instrumento determinativo da diligencia ou acerto do

mérito da conduta administrativa, em termos de eficiência e economicidade das soluções” 12.

Acresce referir que, embora não haja espaço para que se possa fazer uma análise exaustiva destas matérias, importa reconhecer que do princípio da boa Administração, decorrem diversas garantias de natureza administrativa. Incluindo-se, nomeadamente, o direito a um tratamento imparcial, à conclusão do processo administrativo num tempo razoável (ligando-se à celeridade), bem como os direitos de ser ouvido, de acesso ao procedimento e de obtenção da devida fundamentação das decisões. Ainda se destaca o direito de se dirigir às instituições da UE, conforme dispõe o no4 do artigo 41 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (CDFUE)13.

Em suma, entendemos que, de facto, o princípio da boa Administração exerce uma grande influência sobre os mais variados setores do Direito Administrativo14.

3) A boa Administração na prática

11 MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Teoria Geral do Direito Administrativo, 2018, Almedina, Coimbra, 5aedição, p. 112.
12 PAULO OTERO, Direito do Procedimento Administrativo, vol. 1 , 2016, Almedina, Coimbra, 1a edição, P. 272.

13 SUZANA FERNANDA MENDONÇA, A Boa Administração Como Direito Fundamental, 2019, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Lisboa, pp. 78-101.
14 CATARINA SARMENTO E CASTRO, em Comentários ao Código do Procedimento Administrativo, Vol.1, 2020, AAFDL Editora, Lisboa, 5.a edição, p. 81.

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Neste ponto do trabalho, iremos abordar um caso claro em que se verificou a violação do princípio da boa Administração na tomada de decisões administrativas.

Em 2024, dia 4 de Novembro, o sistema nacional de emergência médica enfrentou uma das suas crises mais graves nos últimos anos. A greve dos técnicos de emergência pré- hospitalar do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), iniciada com pré-avisos legais, resultou numa recusa a milhares de chamadas de emergência, colocando em causa a prestação de cuidados essenciais à população.

De acordo com dados noticiados por vários meios de comunicação social, designadamente a RTP, o Expresso e a News Farma15, o dia 4 de novembro destacou-se pelo número alarmante de chamadas não atendidas, ultrapassando as 2.300. Durante este período, foram registadas pelo menos 11 mortes que, segundo familiares e profissionais de saúde, poderão estar associadas a atrasos ou à ausência total de resposta por parte do INEM. Apesar de a instituição ter declarado posteriormente que não encontrou “relação direta” entre as mortes e a greve, a magnitude do impacto e a falha dos mecanismos de mitigação geraram forte contestação pública.

A gestão da greve levantou sérias questões acerca da eficácia da articulação entre o Ministério da Saúde e os serviços operacionais do INEM. Apesar dos pré-avisos de greve terem sido entregues, houve falhas na comunicação e na preparação de serviços mínimos – que são legalmente exigidos em situações que envolvam funções vitais como emergência médica 16 . A ausência de planos de contingência adequados e a descoordenação entre entidades públicas tiveram consequências diretas no atendimento a situações clínicas urgentes.

Tal ação viola o preceito constitucional previsto no artigo 64.o da CRP, que estabelece o direito à proteção da saúde como um direito social fundamental, o facto do Ministério da Saúde não ter precavido tal problema, foi uma violação expressa deste direito.

Para além deste direito ter sido violado, o caso em apreço revela um desrespeito claro ao princípio da boa Administração, nomeadamente através da atuação (ou da inação) do Ministério da Saúde. Este princípio consagra que a Administração deve atuar com

15 https://expresso.pt/sociedade/2024-11-09-inem-nao-definiu-servicos-minimos-para-minimizar-impacto- da-greve-e-presidente-admite-que-so-reagiram-quando-as-chamadas-ja-se-avolumavam-61e7387b - Na presente nota, encontra-se uma das muitas notícias que evidenciaram esta questão.
16 Nos termos do artigo 57/3 da CRP e 397/1 e 2 al. C) LTFP (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas).

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diligência, celeridade, eficiência e economicidade, assegurando assim uma gestão transparente e orientada ao interesse público.

No presente caso, apesar de o direito à greve ser legítimo e constitucionalmente17 garantido, cabia ao Ministério da Saúde, enquanto órgão superior responsável pela organização e supervisão do sistema de saúde, assegurar a continuidade dos serviços públicos essenciais, nomeadamente os serviços de emergência médica. A ausência de medidas eficazes para garantir serviços mínimos, a falta de coordenação institucional e a incapacidade de preparar respostas alternativas à paralisação do INEM revelaram uma atuação administrativa desajustada, tardia e ineficaz. Estes factos comprometem o princípio da celeridade, pelo facto de não se garantir uma resposta atempada às exigências da situação, e o da eficiência, ao não se assegurar uma utilização adequada dos recursos e uma proteção eficaz da saúde pública. Quanto à componente da economicidade, também fora violado na medida em que esta má gestão acarretou custos sociais e institucionais significativos.

Esta falha de organização e de resposta perante uma situação que seria previsível e fora anunciada, revela que a Administração Pública incumpriu com os deveres que lhe são impostos pelo princípio da boa Administração, colocando em causa os direitos fundamentais dos cidadãos, nomeadamente o da proteção da saúde.

Tal situação, evidencia a importância deste mesmo princípio, visto que, se a atuação administrativa não cumpre com os ditames previstos no artigo 5 do CPA, a verdade é que tal tem implicâncias noutros níveis – tais como, a violação de Direitos fundamentais.

4) As Consequências: a possibilidade de controlo judicial

Existe uma problemática relativa à possibilidade ou não, da existência de controlo judicial. Esta problemática surge em função da ligação existente entre o princípio da boa Administração e a questão da tutela do mérito.

Tradicionalmente, entendia-se que reconhecer o valor jurídico a um conceito com estas características poderia levar à interferência do juiz nas competências da Administração, o que seria uma clara violação do princípio da separação de poderes, imprescindível ao Estado de Direito.

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17 Artigo 57/1 da CRP.

Parte da Doutrina discorda que seja possível a existência de controlo judicial relativamente a este princípio. Nomeadamente o Senhor Professor Doutor DIOGO FREITAS DO AMARAL, em que na sua perspetiva, observa-se a tendência para confundir os conceitos de “juridicidade” e “justiciabilidade”. Embora reconheça que o princípio da boa Administração consubstancia, de facto, um dever jurídico, porém tal não implica, necessariamente, a sua justiciabilidade, na medida em que não comporta uma tutela jurisdicional clara e efetiva. Adotando uma visão mais histórica, segundo a qual não será possível obter, em sede judicial, a anulação de uma decisão com base no seu grau de eficiência técnica, administrativa ou financeira. Isto porque os tribunais não se pronunciam sobre o mérito destas decisões, estando o seu controlo restrito à verificação da sua conformidade legal18.

Outra parte da doutrina, consideram este princípio como sendo suscetível de deter controlo judicial. Entre os autores que partilham desta perspetiva encontram-se autores de destaque como PAULO OTERO, MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, CATARINA SERMENTO E CASTRO e FAUSTO DE QUADROS em que sustentam que este princípio também detém uma vertente material ou substancial.

O Senhor Professor Doutor PAULO OTERO, sustenta que tal é uma questão de legalidade e por isso deve ser submetido ao controlo dos tribunais, desde que a avaliação da boa Administração seja feita com base no princípio da proporcionalidade 19.

O Senhor Professor Doutor FAUSTO DE QUADROS, admite uma maior facilidade em controlar a economicidade e a celeridade, pois os tribunais competentes poderão fiscalizar a legalidade de procedimentos em função destas exigências, objetivadas na lei e a própria existência de entidades habilitadas para o efeito. Por sua vez, a eficiência pode deter controlo pelo Direito, especialmente em situações de manifesta ineficiência.20

Entendo que a posição que se parece mais apelativa é a da doutrina maioritária, que reconhece a possibilidade de controlo judicial do princípio da boa Administração. Tal princípio deve ser passível de sindicância jurisdicional. Contudo, importa ressalvar que esse controlo deve ser exercido com prudência de forma a não comprometer o princípio

18 DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Vol. II, 2018, Almedina, Coimbra, 4.a edição, p. 36.
19 PAULO OTERO, Direito do procedimento Administrativo, Vol. I, 2016, Almedina, Coimbra, 1aedição, pp. 273-274.

20 FAUSTO DE QUADROS, Comentários à Revisão do Código do Procedimento Administrativo, 2aed, Coimbra, Almedina, 2022, pp. 29-30.

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fundamental da separação de poderes, presente nos artigos 2 e 111/1 da CRP e artigo 3 do CPTA21. A apreciação judicial não pode, nem deve, imiscuir-se no mérito administrativo das decisões. Assim, defendo que o controlo judicial deve de facto existir, mas de forma equilibrada, salvaguardando o espaço de discricionariedade técnica e de “autonomia” da Administração Pública, como aliás já fora decidido pelo próprio STA (Acórdão de 22/5/14, Proc. No 01412), “[...] por força do princípio da separação de poderes [não pode] substituir-se à Administração ou violar o núcleo essencial da sua autonomia”.

Porém, verifica-se que o princípio da boa Administração não tem sido, na realidade, objeto de uma consideração suficientemente expressiva por parte do poder Judicial em Portugal. Tal explica-se, em larga medida, pelo entendimento de que a sua aplicação implicaria uma forma de tutela de mérito. Ainda assim, é possível verificar-se em alguns acórdãos, menções a elementos parcelares deste princípio, como sejam os valores da “economicidade” e da “celeridade”, relevando uma incipiente, mas significativa, abertura à sua incorporação no discurso jurisprudencial.

5) Conclusão

Em face a tudo o que fora exposto, conclui-se que o princípio da boa Administração, consagrado nos planos constitucional, legal e europeu, constitui um elemento estruturante do Direito Administrativo Contemporâneo, projetando-se como um verdadeiro vetor orientador da atuação da Administração Pública. Dotado de uma natureza pluridimensional, este princípio visa assegurar uma gestão pública mais eficiente, transparente e orientada para a realização do interesse público, exigindo-se, para tal, a sua efetiva concretização não apenas no plano normativo, mas também no plano real, na própria atuação Administrativa.

A sua expressão prática traduz-se na observância de critérios como a eficiência, a economicidade e a celeridade, os quais, orientam a Administração na prossecução do interesse público de forma racional e diligente. Para além do mais, este princípio não se limita a uma função negativa de controlo, desempenhando um papel ativo na estruturação de uma Administração mais eficaz, justa e transparente, sendo indissociável de direitos como a imparcialidade e o dever de fundamentação.

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21 Doravante, Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Ao longo desta exposição, fora abordado o caso da greve do INEM com ocorrência em 2024, que demonstra uma falha do Ministério da Saúde no cumprimento do princípio da boa Administração, ao não garantir serviços mínimos nem uma resposta eficaz à greve. Esta inação comprometeu o direito à proteção da saúde, previsto no artigo 64.o da CRP.

Por fim, embora a jurisprudência portuguesa ainda revele alguma resistência em acolher plenamente o princípio da boa Administração, parte da doutrina defende a sua justiciabilidade, enquanto outra a rejeita por envolver juízos de mérito. Ainda assim, têm surgido referências pontuais a elementos como a “economicidade” e a “celeridade”, revelando uma progressiva, embora tímida, abertura dos tribunais à sua aplicação.

Assim, e em jeito de conclusão, gostaria de enfatizar que o princípio da boa Administração de facto, afeta diretamente toda a atuação Administrativa, pois esta em todos os seus atos deve cingir-se a critérios de eficiência, economicidade e celeridade para chegar ao seu fim último – a prossecução do interesse público.

6) Referencias bibliográficas

  1. ALMEIDA, Mário Aroso de, Teoria Geral do Direito Administrativo, 2018,

    Almedina, Coimbra 5.aEdição;

  2. AMARAL, Diogo Freitas do, 2018, Curso de direito Administrativo, 2.a Edição,

    Vol. II, Almedina, Coimbra;

  3. CASTRO, Catarina Sarmento e, 2020, Comentários ao Código do Procedimento

    Administrativo, coordenação de GOMES, Carla Amado, NEVES, Ana e SERRÃO,

    Tiago, 5.aedição, Vol. I, AAFDL Editora, Lisboa;

  4. CAUPERS, João e EIRÓ, Vera, 2016, Introdução ao Direito Administrativo,

    12.aedição, Lisboa, Âncora Editora;

  5. MENDONÇA, Suzana Fernandes, 2019, A boa Administração como Direito

    Fundamental, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Lisboa;

  6. OTERO, Paulo, 2016, Direito do Procedimento Administrativo, 1.aedição, Vol. I,

    Almedina, Coimbra;

  7. QUADROS, Fausto de, 2022, Comentários à Revisão do Código do Procedimento

    Administrativo, 2.aEdição, Coimbra.

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